Novo estudo liga desmatamento da Amazônia a seca no país
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Cientista sugere desmate zero e reflorestamento contra escassez hídrica.
Em 40 anos, Amazônia perdeu área equivalente a duas Alemanhas.
Cientista sugere desmate zero e reflorestamento contra escassez hídrica.
Em 40 anos, Amazônia perdeu área equivalente a duas Alemanhas.
Imagem de 14 de outubro deste ano mostra árvore solitária em área devastada pelo desmatamento ilegal na floresta amazônica no estado do Pará (Foto: Raphael Alves/AFP). |
O pesquisador Antônio Nobre, do Centro de
Ciência do Sistema Terrestre (CCST), braço do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe) analisou mais de 200 artigos científicos sobre a Amazônia e
sua relação com o clima e as chuvas no Brasil, e concluiu que o desmatamento
dessa região influencia a falta de água sentida nas regiões mais populosas do
país, incluindo o Sudeste.
A diminuição da quantidade de árvores no bioma impede o fluxo de
umidade entre o Norte e o Sul do país, aponta o estudo divulgado nesta
quinta-feira (30).
O relatório “O Futuro Climático da Amazônia”, encomendado pela
Articulação Regional Amazônia, rede composta por várias associações
sul-americanas, tenta explicar as possíveis causas e efeitos da bagunça
climática recente e apresenta soluções que minimizariam os impactos negativos
dessas alterações.
De acordo com o pesquisador, a falta de precipitação, sentida
principalmente no Sudeste, em especial no estado de São Paulo, seria
consequência indireta do desflorestamento amazônico. Desde o início da década
de 1970 até 2013, a exploração madeireira e o desmatamento gradual retiraram do
bioma 762.979 km² de floresta, área equivalente a duas Alemanhas. Os dados
referem-se ao desmate total (chamado de corte raso).
A retirada da cobertura vegetal interrompe o fluxo de umidade do
solo para a atmosfera. Desta forma, os “rios voadores”, nome dado a grandes
nuvens de umidade, responsáveis pelas chuvas, que são transportadas pelos
ventos desde a Amazônia até o Centro-Oeste, Sul e Sudeste brasileiros, não
“seguem viagem”, causando a escassez hídrica.
“A estação seca está se estendendo por maior tempo nas regiões
mais desmatadas e as nuvens de chuva dos rios aéreos não estão chegando, a
partir da floresta ainda existente, em áreas que anteriormente chegavam. Esse
efeito tem conexão direta com o desmatamento”, disse Nobre aoG1. "As
regiões mais desmatadas são a saída dos rios aéreos da Amazônia para o resto da
América do Sul Meridional", complementou.
Segundo a investigação, por dia, a Amazônia
libera na atmosfera 20 trilhões de litros de água transpirada. Nobre compara a
força das árvores aos gêiseres, nascentes termais que lançam periodicamente
jatos de água quente para o alto. Essa transpiração, segundo o estudo, torna
ainda mais valiosa a floresta (além da sua vasta biodiversidade).
Tendência de mais desmatamento
Uma das soluções apresentadas pela pesquisa
para evitar a descontinuidade no fluxo de umidade, e, desta forma, reduzir o
agravamento da seca no Brasil, é zerar o desmatamento na Amazônia. No entanto,
isso parece longe de acontecer.
Levantamento apresentado este mês pela organização Instituto do
Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) apontou aumento de 191% no desmate
da floresta em agosto e setembro de 2014, em relação ao mesmo bimestre de 2013.
Apesar de o dado ser paralelo ao divulgado pelo governo, que usa
os sistemas Deter e Prodes, as informações mais atualizadas do próprio Deter,
referentes a junho e julho, apontaram aumento de 195% na perda de vegetação na
comparação desses períodos entre 2014 e 2013.
Outro ponto alarmante é que o Brasil não
assinou na Cúpula do Clima, realizada pelas Nações Unidas em setembro, um acordo
criado para reduzir pela metade a perda de florestas até 2020 e zerá-la até
2030.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella
Teixeira, disse na ocasião que o país não foi “convidado a se engajar no
processo de preparação” da declaração. Em vez disso, segundo ela, o país
recebeu uma cópia do texto da ONU, que pediu para aprová-lo sem a permissão de
sugerir qualquer alteração. O Itamaraty acrescentou que o documento não é da
ONU, mas dos países que o assinaram, e que o texto necessitava de melhorias,
por isso o Brasil optou por não assinar.
Nobre acredita que o governo brasileiro, ao não assinar a
declaração das florestas, desconhecia os termos presentes no atual relatório e
tem “a esperança de que tais argumentos serão absorvidos pelos
negociadores".
No trabalho, ele cita outras soluções para reverter a situação de
crise na Amazônia e suas consequências drásticas: popularizar os fatos
científicos que explicam a importância do bioma para o clima; reduzir as
queimadas que atingem a região; recuperar as áreas desmatadas com replantio de
novas florestas; e contar com "esforços de guerra" do governo e da
sociedade para financiar ações de preservação e conter o avanço da degradação.
“O diagnóstico é muito sério, as ameaças são reais e as soluções
ainda estão ao alcance para reverter este quadro”, finaliza o pesquisador.
Fonte: G1
Acessado 30/10/2014