Atentado obriga elite a encarar tensão política no Chile
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A explosão ocorrida nesta segunda-feira em uma área nobre de Santiago, no Chile, surpreendeu os chilenos e foi interpretada por analistas ouvidos pela BBC Brasil como um 'alerta' para a elite chilena sobre a tensão política vivida no país.
O incidente, classificado como "atentado terrorista" pelo governo do país, ocorreu próximo à estação de metrô Escuela Militar, no bairro de classe média alta Las Condes, e deixou pelo menos 14 pessoas feridas, segundo informações oficiais do Moinistério do Interior - duas delas em estado grave.
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As primeiras informações apontam que a bomba teria sido deixada em uma caçamba de lixo perto de um restaurante na área de lojas da estação.
Em conversa com jornalistas, o presidente do Metrô, Aldo González, disse que o artefato foi colocado em "uma área contigua à estação Escuela Militar".
Em julho, uma bomba explodiu dentro de um vagão do metrô em outra estação, a Los Dominicos, mas não houve feridos.
Apenas neste ano foram registrados cerca de 29 atentados no Chile, mas o episódio desta segunda-feira foi considerado "grave" e "diferente" dos anteriores.
Autoridades do governo e analistas afirmaram que o atentado foi realizado "para deixar feridos" e "não para abrir caminho para roubos ou uma simples advertência" como em casos anteriores.
"Eu entendo que pelo lugar do atentado, onde mora a elite chilena, o objetivo era fazer um alerta. Pode ser a extrema direita dizendo à elite, reaja, reaja contra as reformas que estão sendo feitas pelo governo", disse à BBC Brasil a analista política Marta Lagos, diretora do Latinobarómetro, falando pelo telefone de Santiago.
Na avaliação de Lagos, existe uma "polarização inédita" no Chile com a "crescente insatisfação da extrema direita".
Segundo ela, setores políticos estariam insatisfeitos com o governo mais à esquerda da presidente socialista Michelle Bachelet, pela segunda vez à frente do país. Dessa vez, Bachelet incluiu o Partido Comunista em sua coalizão de governo.
A analista lembrou que o Partido Comunista estava fora da base governista desde a queda do presidente socialista Salvador Allende em 11 de setembro de 1973.
Lagos acrescentou que atentados como estes "não ocorriam" desde a gestão de Augusto Pinochet (1973-1990).
Tradicionalmente, por marcar o início da ditadura militar, setembro costuma ser um mês politicamente mais agitado no Chile, com protestos ou bombas isoladas por parte de grupos anarquistas.
Para o analista político Guillermo Holzmann, professor de ciências políticas da Universidade de Valparaíso, "tudo leva a crer" que o atentado tenha sido obra de algum grupo anarquista.
"Os atentado anteriores foram praticados por anarquistas. Mas este ano, e especialmente no caso desta segunda, os ataques tiveram como objetivo afetar os transeuntes e o público em geral nos horários de grande movimento", disse Holzmann.
Para ele, a forma de atuar destes grupos, neste ano, sugere a intenção de deixar pessoas feridas e mortas.
"Os dois atentados, o de Los Dominicos, em julho, e esse agora, (em Las Condes), ocorreram em bairros de classe alta de Santiago, mas por onde transitam empregados e trabalhadores em geral que caminham por estas áreas", observou Holzmann.
Segundo ele, o desafio agora será evitar outro atentado, com maior policiamento e inteligência policial.
Ele lembrou que os anarquistas chilenos defendem um discurso 'geral de luta contra o imperialismo', mas salientou que nenhum grupo assumiu a autoria até a noite desta segunda.
"O que ocorreu é absolutamente anormal no Chile e por isso a preocupação de todos", afirmou.
Já Lagos acredita que o ataque possa ter vindo de opositores das reformas – tributária e educacional - realizadas pelo atual governo.
"São reformas que afetam interesses de anos no país, especialmente o setor empresarial", avaliou.
O episódio foi classificado por ministros do governo nacional como "atentado terrorista".
Já a presidente, Michelle Bachelet, prometeu aplicar a polêmica "lei antiterrorista" contra os autores do ataque.
Bachelet suspendeu a agenda desta segunda e também desta terça-feira.
"O que aconteceu foi horrível", disse a presidente à imprensa chilena.
Bachelet também afirmou que o Chile é um país "seguro" e que o governo espera aprovar uma nova lei antiterrorismo que vai aumentar o rigor contra atentados no país.
Com cerca de 17 milhões de habitantes, o Chile costuma ser apontado como exemplo na América do Sul por seus avanços econômicos e sociais.
No entanto, como destacaram Lagos e Holzmann, o país "ainda não resolveu" a desigualdade social.
Na opinião de Lagos, a desigualdade é também um motivo de insatisfação dos chilenos com os políticos, o que não estaria relacionado especificamente ao atentado desta segunda, segundo se especula até o momento.
O 'bombazo' – como o atentado é chamado no Chile – dominou o noticiário das emissoras de rádio e de televisão do Chile, onde apresentadores alertaram para o "temor" dos chilenos de embarcar no metrô depois do incidente.
Fonte: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140908_atentado_chile_mc_lgb.shtml