Mais rico, turista chinês incomoda com gafes e falta de higiene no exterior
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Brics – The
New York Times - 03/10/2013
Eles empurram, ignoram filas e dão escarradas em público.
Com mais dinheiro no bolso, os chineses injetaram US$ 102 bilhões no turismo,
mas causam indignação ao redor do planeta
Os Americanos Feios aterrorizaram europeus e asiáticos com
seus vozeirões e tênis estranhos nos anos subsequentes à Segunda Guerra
Mundial. Décadas depois foi a vez dos grupos de japoneses, que desciam dos
ônibus refrigerados fazendo o sinal de paz e amor para tirar fotos de todo e
qualquer monumento na face da Terra, e até dos varais cheios de roupas
estendidas nos quintais. Agora é a vez de a China encarar o peso das críticas.
E a lista é extensa: eles ficam olhando fixo para tudo e
todos, eles empurram, eles ignoram a gastronomia local. Mas, no ano passado, 83
milhões de chineses deixaram US$102 bilhões no exterior, superando
norte-americanos e alemães no ranking de gastos com turismo, segundo a
organização mundial do setor que pertence à ONU.
Por serem tantos, também se tornaram os turistas mais
antipatizados. Geralmente cheios de dinheiro e desconhecendo os hábitos locais,
saem dos ônibus de excursão aos tropeções com pouco interesse nos bufês de café
da manhã dos hotéis e sem noção nenhuma do que é fazer fila.
A frustração com a nova leva de visitantes foi parar em um
fórum on-line tailandês há alguns meses, no qual os usuários postaram
reclamações que iam desde o tom de voz excessivamente alto à escarrada em
público, entre outras barbaridades.
No ano passado, Thierry Gillier, estilista francês que criou
as grifes Zadig e Voltaire, causou um pequeno escândalo ao dizer ao Women's
Wear Daily que os chineses não eram bem-vindos em seu hotel boutique parisiense
‒ e o volume de críticas que recebeu do mundo todo foi tão grande que acabou
tendo que se retratar.
Como seus antecessores, a riqueza dos chineses é novidade e
não são muitos que sabem se virar em outro idioma, combinação complicada
agravada pelo isolamento histórico de seu país.
"O fato de a China ser uma sociedade sem lei, sem
educação e com muito dinheiro vai se fazer sentir no mundo inteiro",
afirmou Hung Huang, blogueira e editora de uma revista em Pequim.
Apesar de todas as gafes, os países estão praticamente se
engalfinhando para atraí-los: empresas organizadoras de casamentos sul-coreanas
tentam conquistar casais chineses com cerimônias extravagantes inspiradas no
clipe de "Gangnam Style"; uma cidadezinha perto de Sydney, na
Austrália, está construindo um parque temático de US$ 450 milhões com destaque
para a réplica em tamanho natural da Cidade Proibida e um tempo budista de nove
andares; a França, um dos destinos mais populares entre os chineses atualmente
‒ 1,4 milhão só em 2012 ‒ está fazendo de tudo para manter e aumentar esse
interesse.
Tanto que a prefeitura de Paris recentemente publicou um
manual para o setor de turismo que lista frases úteis em mandarim e dicas
culturais para entendê-los melhor ‒ e levar em consideração a grande exigência
em termos de gastronomia e vinhos.
A julgar pelos resmungos que chegam de todo o planeta,
diretrizes como essas podem ser mesmo necessárias ‒, mas a maior desaprovação
parece vir dos próprios chineses. Em maio, um turista em Luxor, no Egito,
percebeu que um compatriota havia vandalizado a parede de um muro de 3.500
anos:
"Ding Jinhao esteve aqui", escreveu ele. Pois o
conterrâneo jogou a foto nas redes sociais, o que acabou levando à
identificação do culpado, um garoto de quinze anos ‒ e a indignação só diminuiu
um pouco quando os pais vieram a público pedir desculpas.
Envergonhado com o volume de críticas na imprensa em agosto,
Wang Yang, vice-premiê chinês, fez um apelo contra a má "qualidade e
procedência" dos turistas que denigrem a imagem de seu país. "Fazem
barulho em público, picham atrações e monumentos, não obedecem à sinalização ao
atravessarem as ruas e cospem em todo lugar", disse ele, segundo o jornal
People's Daily.
Apesar do pedido, manchetes como "Noiva Chinesa Briga
em Campo de Lavanda Francês" continuam a pipocar com frequência. Hung, a
blogueira, culpa as regras do próprio Partido Comunista pela falta de modos dos
chineses no estrangeiro.
"Toda uma geração aprendeu a não dar valor à aparência
ou às boas maneiras porque eram 'coisas de burguês", diz ela. Embora os
chineses estejam mais abertos às ideias ocidentais hoje, isso acaba não fazendo
muita diferença na hora de interagir com o mundo lá fora. "Eles pensam:
'Dane-se a etiqueta. Enquanto eu tiver dinheiro, os estrangeiros vão ter que me
aturar'", completa ela.
Pedras preciosas e bolsas Prada
A maioria dos chineses se diverte para valer lá fora. Em
maio, Huang Honglin e a mulher pagaram US$ 8 mil por uma excursão de 16 dias
aos EUA, país que ele visitou a trabalho há 25 anos, muito antes de se tornar
parte da classe média como dono de uma empresa de comércio exterior.
Dessa vez, Huang tinha dinheiro para gastar. "Compramos
pedras preciosas no Havaí e bolsas Prada em Nova Iorque", conta. E Huang
nunca teve que entrar em uma das boutiques elegantes de Manhattan: preferiu
viajar uma hora rumo ao norte, ao Woodbury Common Premium Outlets, onde as
lojas de grife têm empregados que falam mandarim.
Sua única reclamação foi a de que tiveram que correr pelas
araras com medo de perder o ônibus. "O tempo é muito curto, parece uma
verdadeira guerra", lamenta ele.
Segundo um relatório da McKinsey & Co., quase 70% dos
consumidores chineses de artigos de luxo compram joias da Tiffany e lenços da
Hermès fora para evitar a taxação de importados dentro do país, que pode chegar
a 60% ‒ como a bolsa preta "Neverfull" da Louis Vuitton, por exemplo,
verdadeiro símbolo de status com alças, que custa 14.400 renminbi na China
(US$2.335, pelo menos US$350 a mais que o mesmo item nos EUA).
Em 2007, os EUA foram aprovados como "destino de
viagem", o que abriu as portas a grupos de chineses no início de 2008. No
ano passado, 1,5 milhão de turistas invadiu as terras norte-americanas,
gastando US$ 8,8 bilhões, de acordo com o Departamento de Comércio.
Atualmente, cerca de 150 agências de turismo nos EUA possuem
a aprovação da Associação Nacional de Turismo para organizar viagens a partir
da China, a maioria de propriedade de nativos naturalizados norte-americanos.
Porém, o setor vem tendo dor de cabeça. Apesar de participar
de reuniões na China durante vários anos e da experiência de organizar
excursões e viagens nos EUA há décadas, a agência AmericanTours International
aprendeu que é preciso ter jeito para lidar com os chineses ‒ e que o pessoal
de Pequim e Xangai não viaja no mesmo ônibus.
"Eles brigaram o tempo todo", conta Nick
Hentschel, diretor de desenvolvimento de negócios da empresa.
Em 2012, 1.500 chineses fizeram a excursão de ônibus
"Hollywood a Broadway" da empresa, uma jornada que atravessa o país
em vinte dias com paradas que incluem um cassino em Las Vegas; as pontes de
Madison County, em Iowa; as Cataratas do Niágara; a Casa Branca e o Empire
State Building.
Se os monumentos agradam, os períodos de estadia podem ser
problemáticos. "Tem sempre alguém que fuma no quarto do hotel", diz
Hentschel, hábito que pode custar aos turistas centenas de dólares em contas de
lavanderia e limpeza.
E teve também o episódio de julho, quando um grupo armou o
maior barraco em um hotel em Cody, no Wyoming, porque achou que outra excursão
de compatriotas tinha recebido tratamento preferencial no café da manhã.
Resultado: a polícia foi chamada para acompanhá-los até a saída da cidade.
Cercados por tantos estímulos diferentes, alguns preferem
matar a saudade de casa de alguma forma; foi o caso de Xie Nuoyan, de 20 anos,
universitária de Pequim durante sua visita a Nova Iorque ‒ e embora tenha
gostado da água da torneira, disse que se decepcionou muito com Chinatown.
"Fiquei frustrada porque não tem nada a ver com o que a
gente vê nos filmes, tudo enfeitado com lanternas e apresentações em todo
lugar", reclama.
Já o fato de encontrar tantas opções de comida chinesa
depois de vários dias consumindo pratos ocidentais estranhos foi pura alegria.
"Quando vi arroz, até chorei", confessa.
Disponível em:
<http://economia.ig.com.br/2013-10-03/mais-rico-turista-chines-incomoda-com-gafes-e-falta-de-higiene-no-exterior.html>.
Acesso em: 08 de outubro de 2013
Links complementares:
<http://www1.folha.uol.com.br/turismo/2013/10/1352519-chineses-dominam-turismo-global.shtml>
http://economia.uol.com.br/noticias/afp/2013/05/17/turistas-chineses-nao-civilizados-danificam-imagem-da-china-diz-lider-chines.htm